sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O Ministro e o bandido

Por Ricardo Moreno

Estive casado com Cacilda durante onze anos, e me lembro bem a forma emocionada com a qual certa vez ela se referiu à entrevista dada pelo ministro do Esporte a um canal de televisão. Lembrava do colega do ginásio, no Colégio Estadual João Florêncio Gomes, no Bairro da Ribeira, da construção do Grêmio Estudantil, algo marcante em sua juventude. Os olhos mareados da mãe dos meus filhos, Lucas e Jamile, a remetia ao menino preto, cheio de sonhos, que crescera nas ruas pobres do Lobato, subúrbio de Salvador.
Eu já conhecia Orlando da militância no PCdoB, e quando cheguei ao DCE da UFBa, o cara já estava na UNE, e logo se consagraria como o primeiro negro a ser presidente de uma das maiores instituições dos movimentos sociais do Brasil. Sempre que o encontrava, em Salvador, ele fazia questão de me perguntar da sua antiga amiga.
Pois bem, o jovem Orlando tornou-se ministro do Esporte, mas não apenas isso: o maior ministro do Esporte que esse país já teve. Organizou o vitorioso Pan do Rio, trouxe para o Brasil a Copa do Mundo e a Olimpíada, e com isso vem mobilizando muitos recursos, gerando empregos e promovendo melhorias nas grandes cidades brasileiras. Além disso, promoveu importantes iniciativas, como o projeto Segundo Tempo, com investimentos nunca antes vistos no desenvolvimento esportivo nacional. E tem enfrentado com coragem esquemas poderosos e viciados como os do futebol, por exemplo.
Fico imaginando o quanto o sucesso desse menino preto, pobre e comunista pode impactar na cabeça dos conservadores. O temor da revolução haitiana deve ser um fantasma que habita no inconsciente desta elite branca.
Vendo suas representações políticas cada vez mais isoladas e perdendo espaço, estas elites há muito vêm se agarrando desesperadamente em práticas facistas de comunicação, se aproveitando do monopólio privado da mesma, especialmente na TV, de grandes revistas e jornais para, por meio de campanhas difamatórias, tentarem desestabilizar o governo, desde Lula, e agora, mais intensamente, Dilma.
Para mirar seus estilingues em Orlando, escolheram a Veja, um quase panfleto que é editado nos quintais das casas de tucanos, e cuja ausência de ética e credibilidade pública é notória; por isso mesmo, despudorada e ideal para emitir lixo em forma de reportagem, sem nenhuma limitação em fazê-lo. E como acusador, lá veio um tal João Dias, um policial militar que estranhamente possui um BMW, um Camaro, uma Frontier, uma mansão de R$ 2 milhões e 11 processos nas costas, e que com os holofotes do sucesso garantidos pela mídia golpista, declara: “Não sou bandido, sou polícia”.
Mas o que passou desapercebido polos manipuladores do PIG é que Orlando representa a tradição de noventa anos de lutas populares em defesa das mais avançadas bandeiras desta País. Como diz uma frase lançada na campanha em solidariedade ao ministro, são noventa anos e não noventa dias, esse Partido Comunista do Brasil.
Surpreendendo a todos, Orlando se apresentou imediatamente, e voluntariamente, ao Congresso Nacional, abriu o seu sigilo fiscal, bancário e telefônico. Solicitou que a Procuradoria Geral da República, o Ministério da Justiça, a Polícia Federal e a Comissão de Ética Pública da Presidência investiguem todas as denúncias de desvio de dinheiro público e corrupção, também se colocou à inteira disposição da Câmara, do Senado Federal e do Tribunal de Contas da União para prestar todos os esclarecimentos necessários. É como disse a minha amiga Olivia Santana: "quem não deve, não teme".
Enquanto isso, o bandido posudo de acusador fugia de prestar depoimento à PF alegando problemas de saúde. No entanto, o deputado Delegado Protógenes (PCdoB-SP) pediu às comissões de Turismo e Desporto e de Fiscalização e Controle que encaminhem um ofício à Polícia Federal informando o comparecimento do mesmo João Dias a uma reunião no gabinete da liderança do PSDB, sem apresentar problema de saúde algum. O militar está envolvido num esquema de desvio de recursos do programa Segundo Tempo comandado pelo Ministério do Esporte.
Além disso, o militar anuncia ter provas do envolvimento de pessoas do ministério, mas não as apresenta. Protógenes cobrou que caso as ditas provas existam, elas precisam ser apresentadas rapidamente à Polícia Federal, instituição que tem a responsabilidade de investigar denúncias contra ministros de Estado e capacidade técnica para periciar provas.
Pois é, mexeram com o vespeiro errado, apoiados em uma bengala torta. Vendo a coragem e firmeza de Orlando, sinto um imenso orgulho de ser comunista, mas tenho certeza de que este ainda não alcança o tamanho do orgulho que Cacilda deve estar sentindo daquele seu velho amigo!
Ricardo Moreno é professor de História UNEB; doutorando em História UFF e editor da Revista Dialética (www.revistadialetica.com.br)